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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Músculos da laringe e a voz - Parte 2

Segunda parte do texto que começa AQUI

Quando falamos em “voz de peito”, pensamos em um som cheio, “voz plena”, vibração na cavidade torácica, notas graves, e o contrário vale para a “voz de cabeça”, que relacionamos a sons mais agudos com maior leveza.
Porém, pensar na voz apenas desta forma, nos coloca em situações complicadas. Se voz de peito cria a sensação de vibração no peito, e soa firme, por que uma voz suave, na mesma nota grave, mantém a vibração? Se “falsete” é a extensão do agudo, que soa fraco e “falso” (elimine a expressão “voz falsa” da sua mente), como pode existir o “falsete reforçado”, qual a diferença disso pra "voz de cabeça"?

Aqui entra o segundo sistema, responsável pelo nível de adução da glote. 
Enquanto o TA interno (com aquele comentado problema da definição confusa) teria a função de "encurtar" a prega vocal, deixando a nota mais grave, o TA externo aumentaria a adução (fechamento glótico) deixando o som mais "encorpado", mais "pesado", e junto dele estão os CAL e os IA (aritenóideos oblíquos e transversos). Essas subdivisões NÂO ESTÂO COMPROVADAS e todos os estudos mais sólidos tratam isso como suposição, bem aceita, mas suposição. Algo como o Big Bang vocal.

E os CAL, além de girar as cartilagens aritenóideas, fechando a ponta da parte posterior da glote tem mais alguma função?
Segundo Chhetri e Neubauer publicaram em 2016, Os CAL isolados teriam um poder de controlar as frequências produzidas bastante limitados, algo entre Ré 2 e Mi 2 (145 - 165 Hz), sim, 1 tom apenas. Entretanto, ao serem acionados em conjunto com os TAs, eles funcionam como assistentes, possibilitando que o músculo vocal faça as alterações de nota desejadas pelo cantor.

Vamos ao TA e sua infinita complexidade...

Em 1998, Ira Sanders e equipe investigaram o TA humano, e encontraram os compartimentos superior e inferior, mostrando uma possível ação diferente dos dois.
Procurei o Dr. Sanders, que de forma muito simpática respondeu algumas dúvidas, e segundo ele, foi observado que a parte inferior do Vocalis (TA interno) contrairia, encurtando as pregas vocais. Já o compartimento superior seria formado por inúmeros "pedacinhos de músculo". Ainda há muito a ser estudado sobre isso, e existem dificuldades técnicas ainda. Essa parte superior, poderia, por exemplo, alargar a borda da prega vocal durante a fonação (produção do som), o que aumentaria a massa, gerando um som mais firme ou talvez não.

Daí a confusão de função de TA interno e externo talvez, na verdade o TA seria dividido em 3 partes, não em duas.

Percebe-se que ainda é um campo aberto para pesquisas mais aprofundadas.

Na imagem vemos um corte frontal de uma prega vocal, note que não há barreira entre TA interno e externo, o mesmo músculo possui diferentes áreas com diferentes funções cada:
M = muscularis, ou o TA externo, tireomuscular
SV = Vocalis Superior = TA interno superior, tireovocal superior
IV = Vocalis Inferior = TA interno inferior, tireovocal inferior
VF = Prega Vocal
LV = Vestíbulo laringeo (o "bolsão" que se forma entre as pregas vocais e as vestibulares)
FVF = Pregas Vestibulares

Resultado de imagem para cricoarytenoid posteriorO oposto da adução é o trabalho realizado pelos CAP, que abduzem o mecanismo, e graças a eles, nós respiramos. (obrigado por existir!!!)

Pensando nos sons tradicionais dos registros vocais, uma “voz de peito” teria um bom nível de firmamento glótico com um comprimento de prega vocal não muito estirado. Uma “voz de cabeça” seria um som com menor resistência muscular e pregas vocais mais alongadas. 
Concorda que estamos lidando com 2 conceitos diferentes? Grave e agudo depende de uma coisa, "leve" e "pesado" depende de outra coisa (não confundir com volume e intensidade). No momento em que colocarmos tudo no mesmo pacote um(a) cantor(a) terá problemas de realizar notas agudas com “pegada”, pois, inconscientemente, o movimento de encurtar pregas vocais e de aumentar a resistência muscular estarão conectados, impedindo o agudo. Nesses casos a solução encontrada normalmente é aumentar a pressão de ar, e aí o estrago está feito.

Separar as ações do TA pode ser o primeiro passo pra resolver esse problema. Apesar de já ser algo conhecido pela ciência vocal há algumas décadas, para o canto isso é mais recente. Não posso afirmar que seja o primeiro pois podem haver trabalhos anteriores que não conheço ou não me recordo, mas o dinamarquês Daniel Zangger Borch foi um dos pioneiros a trazer de forma explícita esses conceitos para a pedagogia vocal em seu livro "Ultimate Vocal Voyage", de 2007, e certamente isso aconteceu pois ele, além de cantor, é pesquisador de voz, tendo até trabalhos publicados em conjunto com Sundberg sobre "dist tones" (os vocais distorcidos, conhecidos no Brasil como drives) e formantes em cantores de rock. Hoje essa distinção já é menos rara, e diversos professores de canto trabalham dessa forma, inclusive no Brasil.

Herbst, doutor em pedagogia vocal, pesquisou diferentes tipos de adução, e em 2011 publicou artigo diferenciando duas formas distintas que devem ser treinadas para a produção de timbres diferentes na voz de acordo com o estilo cantado. Essa mudança de maior ou menor adução aconteceria em notas graves ou agudas, que ele coloca no artigo como "registro peito" ou "falsete", conforme figura abaixo.
Um cantor equilibrado terá todos esses músculos bem treinados e os sistemas independentes.

Como resolver e estudar isso?

Entram os Modos de Fonação, que comento AQUI. Por hora, o importante é saber separar frequência (tensão de pregas vocais) de nível de resistência glótica (adução/abdução).

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Músculos da laringe e a voz - Parte 1

Você, que frequenta este site e se aprofunda no estudo de canto, já está cansado de ouvir falar em TA, CT, adução, abdução, etc., mas às vezes isso pode ser um pouco, ou muito, confuso.

Tenho alguns textos sobre anatomia e fisiologia da laringe (que você pode encontrar no menu ao lado), mas agora vou me aprofundar mais nesse tema, retomando a palestra que ministrei para o 1º Congresso Brasileiro Online de Voz Cantada.

A laringe é aquela “caixa” que fica no pescoço, logo acima da traqueia e abaixo da base da língua, e nela estão os músculos responsáveis pela produção do som da nossa voz, a nossa fonte de vibração.

Todos vocês já sabem que lá dentro estão as pregas vocais, que são dobras musculares, que quando vibram mais rápidas fazem notas mais agudas e quando têm ciclos de vibração mais lentos emitem notas mais graves, vulgarmente chamadas de som fino e som grosso.

Aqui vale comentar que na fisiologia e na acústica não existem notas altas e baixas, o que muda é a velocidade dos ciclos (das pregas vocais ou ondas sonoras). Inconscientemente, essa percepção equivocada leva muitos cantores a se esticarem pra alcançar as “notas altas”, criando tensão e prejudicando a liberdade laríngea. A Idea de altura vem das partituras, onde as notas mais agudas são escritas em linhas superiores no pentagrama e as graves nas linhas inferiores.
Onda sonora: Na primeira linha, temos
 mais ciclos por segundo, gerando
frequências mais agudas que
na segunda

Voltando.

Eu gosto de pensar na laringe como a junção de dois sistemas que devem ser distintos e independentes, e quando não o são, criam problemas como as “quebras na voz” ou limitações de notas, é o que acontece com expressões como “voz de peito” e “voz de cabeça”, que são cheios de significados específicos mas empregados de forma generalista.

Um desses sistemas é responsável pelo controle de frequência de vibração, a velocidade da vibração das pregas vocais, que comentei acima.
Todos sabem que a contração de TA (par de músculos tireoaritenóideos) “encurta” a prega vocal e CT (par de músculos cricotireóideos) as “alonga”, mas não é só isso, e deve-se tomar muito cuidado aqui.

Estamos falando na tensão das pregas vocais, e muita coisa está envolvida.

Primeiro, é importante entender que o TA é dividido em 2 partes: tireovocal (interno) e tireomuscular (externo). Cada uma dessas partes faz uma coisa diferente. Para o controle de frequência, o TA interno é o que nos importa (alguns estudos dizem que é o externo, outros o interno, mas deixo essa questão para a ciência resolver), é essa parte que contrai diminuindo o comprimento das pregas vocais (para as notas graves).

Os músculos CAL (par de músculos cricoaritenóideos laterais) também poderiam contribuir, com os graves mais graves, mas falaremos mais sobre eles no segundo sistema.

Para deixar as pregas vocais alongadas, e as notas mais agudas, além de uma ação predominante dos CT sobre os TA internos poderíamos solicitar a ação de um par de músculos que têm como função primária abrir espaço na laringe para que possamos respirar, são os CAP (par de músculos cricoaritenóideos posteriores). Quando ativados, além de realizarem a abdução (abrir a glote), eles poderiam, segundo o Dr. Hollien, proporcionar um alongamento extra das nossas pregas vocais se conseguirmos ativar apenas parte de seus feixes.
Visão dos feixes dos CAP por trás, a flecha A indica o feixe que deveria ser contraído para aumentar o alongamento das pregas vocais.
A ação de CAP se opondo aos IA, TA e CT, é vital para quem canta notas hiperagudas, e foi notada em 1972 (Thomas Gay e equipe) e depois abordado novamente em artigo de 1979 de Hary Hollien, que disse que qualquer ideia de que a tensão das pregas vocais analisada somente por TA e CT deveria ser considerada incompleta. Entretanto, ainda hoje é utilizada, seja de forma pedagógica para simplificar aos alunos não tão interessados na fisiologia ou por quem não conhece essa hipótese.

Os músculos aritenoideos - IA (ou interaritenóideos) também são acionados nos hiperagudos, como constatado pelo professor Hirano, um dos responsáveis pela laringologia moderna, em 1980, mas no estudo não foi medida a ação dos CAP, então não é possível saber se há relação nos dois movimentos.

É preciso tomar cuidado com as cartiilagens aritenóides aqui. Woodson e seus colegas de Memphis, terra do Elvis, estudaram a ilusão causada pela adução (aproximação) dessas cartilagens. No estudo deles de 1997, a adução posterior (fechamento na parte de trás da glote) abaixa a parte das cartilagens que estão ligadas à membrana das pregas vocais. Isso visto em uma lideolaringoscopia, por causa do ângulo de filmagem, faz parecer que houve um super alongamento das pregas vocais pra trás, que na verdade foi de apenas 1 mm em média no estudo. Talvez daí a importância dos CAP. IA dá uma segurada e CAP puxa trás trás pra não cair pra frente... Saberemos um dia...

Importante frisar que esse mecanismo de alongamento "CAP+IA" não é 100% comprovado, mas seu conceito é algo aceito por grandes cientistas da voz, como o Prof. Ingo Titze, que em estudo publicado em 2016 disse que além do alongamento das pregas vocais, uma outra ação seria mais eficiente, levando as notas para regiões mais agudas, independente do tamanho da laringe ou espaço para alongamento, que é limitado por questões físicas, variando entre os indivíduos.

Segundo o professor, aumentar a densidade do ligamento das pregas vocais aumentaria a tensão da "corda" e possibilitaria esses ajustes, e o melhor, segundo o próprio estudo, é que isso pode ser alcançado com treino vocal, através de manobras como o alongamento. Hirano em 1980 também falou que aumento de adução aumentaria a frequência emitida, talvez isso aumente a densidade do ligamento vocal? Quem sabe? Muito a se estudar ainda.
Essa representação de uma prega vocal mostra o ligamento vocal, que é formado pelas camadas intermediária e profunda (intermediate e deep) da lâmina própria.
Ainda existem imagens de cantores super agudos que conseguem "fechar" parte das pregas vocais, deixando a parte que vibra menor, e consequentemente, mais rápida (aguda). Em 1955 Pressman e Kelemen descreveram o que chamaram de efeito de amortecimento, ou Damping Effect. Durante este efeito, a porção posterior das pregas vocais aduz e esse fechamento vai se estendendo para a parte anterior, como que em um zíper, deixando apenas uma porção menor das pregas vocais livres para a vibração, o que funcionaria como pinçar uma corda de instrumento quando se quer tocr uma nota mais aguda. Atualmente é muito comum ver tal técnica sendo treinada em países como a Itália.

O Dr. Mattias Echternach (Alemanha) estudou os hiperagudos de cantoras e encontrou diversas configurações glóticas para as mesmas regiões, desconfiando da importância da ressonância para a produção dessas notas e até mesmo de uma possível segunda fonte sonora. O certo é que ainda há muito a ser estudado para cravar que nota A a musculatura se comporta de um jeito, nota B de outro. Claro que um treino pode escolher umas dessas opções e direcionar as ações musculares, o que ao mesmo tempo é mais prático para o estudo e desenvolvimento e limitante para as possibilidades e individualidaddes sonoras. São os paradigmas da pedagogia vocal no estágio em que vivemos, onde ainda há muito a se descobrir.

Já o CT é formado por 3 feixes. Sanders e sua turminha estudaram ess músculo em 1998 e observaram que por baixo dos feixes oblíquos e retos existem os feixes horizontais. Segundo o o que se sabe até agora, o feixe o feixe reto serve para aproximar as cartilagens, levantando a cricóide e abaixando a tireóide e deixando nossa voz mais aguda. O feixe oblíquo teria uma relação com a função respiradora do CT, puxando a cartilagem tireóide para frente. Já o feixe horizontal, não se sabe, tanto é que quase ninguém fala dele.

Pronto... pronto nada... O mesmo Ira Sanders nos mostrou um outro músculo, o cricotireofaringeo (CTF). No estudo ele não pôde afirmar muito, mas hipotetizou que seria um músculo estabilizador das juntas e cartilagens. O CTF seria algo exclusivo dos humanos e sua função seria altamente relacionada à fala e ações mais especializadas que nós temos em relações a outros animais. Que mais será que ele faz?
CTF pontilhado entre o CT e o "CP" (CF - cricofaringeo, em inglês)
São muitas formas de ir além do comum, e um bom método de treino de canto precisa estar atento às diferentes possibilidades para não restringir a habilidade e expressividade dos cantores.

Veja que não estou falando sobre registros vocais tradicionais, esqueça "voz de peito" e "voz de cabeça" aqui. São termos recheados de significados estéticos que estão começando, timidamente, a cair em desuso, apenas falo sobre notas graves e notas agudas e o que a ciência tem de mais atual sobre o tema.

CLIQUE AQUI para ver o segundo sistema que atua na fonte sonora.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Resumo do Workshop - Fisiologia da voz e técnica vocal no rock

No dia 16 de abril é comemorado o dia mundial da voz, e neste ano participei ministrando um WORKSHOP sobre fisiologia e técnica vocal no rock e derivados.

O WORKSHOP foi no dia 17, sexta-feira. na Escola RUAH Arte Música, que me convidou e cedeu o espaço.
No site internacional do World Voice Day, o workshop aparece pelo link Workshop no WVD 2015

Foi uma alegria enorme poder preparar esse curso especial e encontrar cantores, professores e fonoaudiólogos interessadas em aprender e compartilhar suas experiências em mais de 3 horas de curso, onde procurei mesclar parte teórica e prática.
 Os temas abordados foram:

  • Avanços e história da ciência vocal
  • O que é a técnica vocal
  • Aquecimento vocal - sua importância e modelo de aquecimento para cantor de rock
  • Anatomia e fisiologia das pregas vocais
  • Anatomia e fisiologia da laringe em geral, músculos extrínsecos e intrínsecos e como desenvolvê-los
  • Anatomia e fisiologia da respiração no canto, e como trabalhar o apoio respiratório no canto em geral e nos momentos mais intensos do rock
  • Registros vocais e os ajustes musculares que os produzem, e como acessaá-los
  • Ressonância e articulação
  • Canto harmônico, e como emitir duas notas ao mesmo tempo
  • Estéticas vocais 
  • Vibrato
  • Técnica e ajustes vocais no rock
  • Distorções vocais. As pesquisas publicadas e métodos de treinar diferentes formas de criar o que muitos conhecem como drives ou voz rasgada
  • Dicas para cantores de rock e metal, a importência de ser um atleta da voz
  • Desaquecimento Vocal
Como puderam perceber, foi um curso denso, com bastante conteúdo, e estou muito satisfeito por ter feito tudo com uma base sólida científica por trás das informações, mencionando fontes e promovendo o bom uso da ciência vocal, da forma como acredito ser a melhor para a evolução do canto e da pedagogia vocal, quebrando mitos e tabus historicamente estabelecidos.

Quero agradecer imensamente à equipe da escola Ruah, e ao participantes do evento, desejando que cada um possa ter aproveitado tanto quanto eu.

Nos vemos ne próxima oportunidade

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Os registros vocais - Parte 4

Falsete, o registro elevado

O termo “falsetto” descreve um tipo específico de som, bastante suave e "infantilizado". A leveza desse som é causada pelas pregas vocais se tocando levemente, o TA (músculo da prega vocal) repousa quase totalmente e o som é controlado pelo CT. É uma produção que tem pouco contato na borda das pregas vocais, que ficam bastante esticadas e vibrando quase que paralelamente.

Aqui cabe um comentário. Muitos dizem, talvez de forma didática, que no falsete o TA desliga e no fry o CT desliga. Atenção!, músculo não têm tomada e não desliga, a menos que sofra uma paralisia. Quando ouvir frases do tipo, entenda como "o músculo fica em atividade muito baixa", e jamais, "para de funcionar".

Voltando, sua característica é o alcance dos agudos além do registro modal e é normalmente leve e soproso em vozes não trabalhadas.

Trabalhar falsete é de extrema importância para desenvolver os demais registros e é muito usado em inúmeros estilos musicais. Quando bem trabalhado se torna mais uma arma do bom cantor.

Polêmicas acerca do falsete:
O termo surgiu pois, na idade média, as mulheres (geralmente) não podiam cantar nas igrejas e os compositores utilizavam crianças, ou mesmo adultos (contra tenores, castratti, etc.) que falseavam a voz feminina, imitando-as. Muitos interpretam o falsete como sendo uma voz falsa, alguns dizem que o cantor em falsete está usando uma voz que não é a dele, o que, pela descrição acima não se sustenta.
Algumas pessoas vinculam o nome falsete às falsas pregas vocais, mas não há qualquer relação. O falsete é produzido nas pregas vocais, e não é nem mais nem menos que os outros registros, apenas um outro tipo de comportamento muscular.
Todos podem produzi-lo, homens e mulheres, pois trata-se de um mecanismo fisiológico, e não estético, bastando apenas treino e direcionamento correto para atingi-lo.

Por muito tempo se acreditou que falsete feminino não existia, e isso está certo e está errado (?). Se você pensar no termo "falsete", ele vem de falsa voz feminina, ou seja, homens imitando mulheres, então, mulheres não precisam imitar ninguém e o som sai naturalmente, não tem falsete, certo? Não é bem assim. Pela configuração fisiológica a mulher faz o mesmo que os homens, a diferença é que nos homens a diferença no som desse registro é mais perceptível. Então, mulher faz falsete, mas essa nomenclatura fica estranha, daí a necessidade de se usar outro termo para esclarecer, como registro elevado.

Exemplo de falsete você ouve no refrão dessa música ao lado:

Existe ainda um registro (que na verdade, podem ser dois) acima do falsete, que você ouve aos montes nos trabalhos da cantora Mariah Carey, ou David Lee Roth do Van Halen, Eric Martin do Mr. Big, etc. chamado de Registro Flauta (o Registro Asssobio poderia ser uma variação do Flauta), mas ainda há muito a ser estudado sobre ele. É sabido que emite um som extremamente agudo e cristalino e com pouca pressão aérea com as pregas vocais bastante tensionadas, e deixando apenas parte de seu cumprimento vibrando, e muitas vezes elas nem vibram (daí a diferenciação entre Flauta e Assobio), apenas param e recebem o ar que passa sibilando no seu vão.


E chegamos ao fim dos textos sobre os registros vocais, laringe e funcionamento das pregas vocais na visão tradicional. E quais conclusões podemos tirar disso tudo?

Certamente a ação desses músculos todos é responsável pelo tipo de som que produzimos, não tendo qualquer relação com onde ele ressoa, ou onde sentimos vibrar, como se pensou por muito tempo. As sensações de vibração, ou de som mais aqui, mais ali, etc. aparecem com o uso dos ressonadores e da articulação, que complementam os registros, criando estéticas diferentes, mas ressonância é tema de outro post aqui no blog.

Conhecer a ação muscular dentro da laringe interessa como para quem quer começar a cantar, ou desenvolver sua técnica vocal?

Gosto sempre de comparar o canto ao esporte, onde o atleta precisa desenvolver seu corpo, fortalecê-lo, deixa-lo maleável e treinar seus movimentos para dominar sua arte. No canto é a mesma coisa. Sendo a base do controle de voz o trabalho muscular, é imprescindível que haja um treinamento focado no desenvolvimento desses músculos, seja CT, TA, musculatura intercostal, diafragma, língua, lábios, etc., e do resto do corpo todo. E, para isso, precisamos conhecer esse corpo, saber o que precisa ser feito para deixá-lo apto ao canto, pois não há truques, não há mágica, nem receita do bolo, apenas um instrumento musical que deve ser preparado para o uso, como qualquer outro.

A magia está no resultado produzido por um canto bem feito, utilizando emoção e expondo sentimentos, e não no processo de produção dele, mas dominá-lo te dará ferramentas mais versáteis para ter a voz expressiva que todos sonham.

A forma de classificar a voz em peito, cabeça, mix e falsete está sendo substituida por formas mais completas que vêm surgindo com os avanços da pesquisas em voz, já que essa vem de uma tradição de canto com uma estética específica e que não explica todos os sons e possibilidades vocais que temos.
Conheça visões mais atuais do controle da voz e explicações mais aprofundadas do mecanismo das pregas vocais CLICANDO AQUI.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Os registros vocais - Parte 3

Ainda no Registro Modal, temos uma outra subdivisão:

 - A voz de cabeça (modal com predomínio de CT)

O termo "registro de cabeça", assim como ressonância na cabeça, voz de cabeça, mecanismo ou voz leve e registro alto são todos referentes ao som produzido pela ação do músculo Cricotireoideo (CT) sobre as pregas vocais, alongando e afinando-as para subir a nota aumentando o comprimento e tensão, através disso fazendo com que apenas os limites superiores das pregas se encontrem. Isso pode ser chamado de comportamento do CT.

Observe no gráfico do Dr. Donnald Miller como o corpo da prega vocal em contato é maior no registro mais pesado e menos no registro mais leve

A condição natural do registro de cabeça é que ele é fraco, principalmente nas notas baixas (graves), normalmente é soproso em quem não está habituado a produzi-lo, na maioria dos casos, os homens.

Utiliza-se o músculo CT, que estica e afina as pregas vocais para atingir as frequências mais agudas e gera um quociente de abertura maior por ciclo de vibração, as pregas vocais ficam abertas mais tempo durante a vibração.

É a qualidade mais leve e suave da voz, ligada à voz feminina, infantil e ao falsete, a voz de cabeça está geralmente associada à doçura, pureza, intimidade, leveza, tranquilidade, suavidade, etc.

 - Voz mist(modal com equilíbrio entre TA e CT)

O mix é conhecido como sendo um registro entre peito e cabeça, mas ele é mais um ajuste da mistura dos comportamentos dos músculos TA e CT, podendo ser "Misto-Peito", com prioridade do músculo TA sobre CT ou "Misto-Cabeça", priorizando a utilização do CT sobre TA.
Como uma balança podemos pensar que eles se mesclam 55% para um lado, 45% para o outro, 27% / 73%, ou 34% / 66%, e por aí vai, o importante é saber que usando mais TA o som fica mais potente, usando menos, fica mais suave.

Controlar esse balanceamento de registro é o que nos permite remover a “quebra” no som, mencionada anteriormente, e oferece ao cantor a possibilidade de fazer notas agudas com o vigor das notas mais baixas ou notas graves com a sutileza das mais agudas.

O mix acontece quando TA e CT estão fortes o suficientes para conseguirem interagir de maneira completa. Portanto, para desenvolvermos tal registro é necessário trabalhar os demais, fortalecendo-os e condicionando-os. Podemos pensar no registro modal como um grande mix, alternando seu balanço e escolhendo o som que se quer, por essa razão está se verificando que não existem subregistros, mas apenas um grande mecanismo de interação entre a musculatura da laringe.

Esse é o trabalho do treino de técnica vocal, transformar músculos em arte.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Os registros vocais - Parte 2

Hora de falar sobre os registros vocais tradicionais especificamente. São aqueles três, basal, modal e elevado, lembra? Vamos ao primeiro:

Registro Basal

É um som pouco usado no canto, mas visto com frequência na fala, principalmente nos filmes americanos. É o som que fazemos quando imitamos um zumbi, Frankenstein, etc. Nele o músculo CT (lembre-se, o que estica as pregas vocais e deixa o som mais leve e agudo) está quase totalmente relaxado, apenas com ação do TA (músculo vocal, que encurta e aproxima as pregas vocais) e o som é grave (de baixíssima frequência) e se assemelha ao estouro de bolhas ou óleo fritando, daí o apelido vocal fry. Esse tipo de som, quando feito em notas mais agudas é chamado de voz crepitante, mais famoso como Creaky Voice (daí a origem da distorção vocal que alguns chamam de drive Creaky Voice).

Registro Modal

É aqui que as coisas acontecem na maior parte do tempo, onde CT e TA (claro que você lembra deles) interagem de forma intensa e criam a mais variada gama de sons e estilos. O modal é subdividido historicamente em registros peito, cabeça e misto, mas não confundam registros com ressonância, vibração do som, energia cósmica, nada disso, ok? E lembrem-se, essa subdivisão é utilizada de maneira pedagógica.

 - A voz de peito (modal com predomínio de TA)

O termo registro de peito, e também, voz de peito, mecanismo ou voz pesada e registro baixo referem-se ao som produzido pelo corpo principal da prega, que traz toda sua profundidade aproximando-a para a vibração. É o comportamento do TA.
Predomina o uso do músculo Tireoaritenóideo – TA, mais forte, que encurta e engrossa as pregas vocais e aumenta a amplitude da onda mucosa e o movimento das bordas das mesmas (assista o video postado AQUI e repare na mudança da onda no começo, mais grave, para o final, mais agudo). Tem maior quociente de fechamento por ciclo de vibração das pregas vocais, ou seja, as pregas ficam mais tempo fechadas que abertas durante a vibração.

Na visão de cima da laringe as setas mostram o movimento dos músculos vocais, de encurtamento.
Curiosidade: repare como podemos ver uma divisão no músculo TA, a parte mais próxima do centro, é o TA interno, ou tireovocal, a parte mais longe do centro é o TA externo, ou tireomuscular. o TA interno é responsável por esse encurtamento da prega vocal, deixando o som mais grave, enquanto o TA externo ajuda a fechar o espaço entre as pregas, aumentando a intensidade e dando mais "força" ao som.

A "voz de peito" tem como característica um som mais forte, encorpado e consistente, muitos a chamam de “voz plena” em detrimento dos outros registros.
Sua região natural é a mais grave, mas como é uma voz mais forte que a de cabeça muitos estilos a solicitam em regiões mais agudas, como em musicais, no rock, ou mesmo em cantores líricos.

Sabe aquela voz que, normalmente, usamos para dar bronca ou chamar a atenção de alguém? Eis o registro baixo, ou voz de peito, subdivisão do registro modal.
Emite um som normalmente associado ao poder, dramaticidade, firmeza, paixão, força. Ligado à voz masculina.

No próximo, a voz de cabeça e a junção dos subregistros modais.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Os registros vocais - Parte 1

“A chave para cantar bem é entender a função dos registros” - Jeannette LoVetri

Aqui é a casa da discórdia na ciência e pedagogia vocal. Ao longo da história, os registros foram descritos de inúmeras formas e em diversas quantidades, aqui tentarei tratar o tema da forma mais simples possível e tentando ligar termos conhecidos pela maioria.

Quando vamos da nossa nota mais grave até a mais aguda notamos mudanças no timbre, no tipo de som emitido, a voz passa de um som “de porta rangendo”, chega a uma massa sonora forte e vigorosa e vai para uma mais suave e por vezes soprosa ou “fininha” como de criança, e essa é a visão tradicional da nossa voz.
Essas variações ocorrem porque nossa laringe está produzindo o som de formas diferentes. Cada uma dessas formas dependem de quais músculos estão sendo mais ou menos acionados, e o que essas diferenças causam no corpo das pregas vocais e na forma como elas vibram. Costuma-se chamar essas configurações musculares de registros vocais, mas podemos encontrar com as mais diversas nomenclaturas, como vozes, arranjos musculares, mecanismos laríngeos, ajustes, esquemas, etc.. Cada um desses registros tem suas determinadas características, que serão vistas a seguir.

Nessa mesma situação, do grave ao agudo, podemos observar “quebras” no som, algo como uma falha entre as regiões, isso acontece quando não há uma “passagem” de registro sutil. A voz reflete essa “troca brusca” e soa como uma engasgada durante a frase cantada.

Anteriormente vimos que a parte intrínseca (aquela que está dentro) da laringe é formada por músculos que esticam, encurtam, estreitam, alargam, etc. as pregas vocais. Quando o ar passa pela laringe as pregas vocais podem estar abertas (na respiração) ou podem obstruir a passagem do ar, fechando o canal, como em um apito.
Esq. Pregas vocais durante a fonação - Dir. Pregas vocais durante a respiração
E quais são esses registros, ou mecanismos vocais?

Muitas coisas ainda são um mistério, muitas estão sendo estudadas neste exato momento e poderão, ou não, sofrer alterações, mas a ciência percebia três registros básicos: basal (vocal fry), modal e elevado, além de um último, o assobio, ou flauta, que muitos consideram como sub registro do elevado.
Registros chamados de peito, cabeça e misto são subdivisões do registro modal, é nele que acontece a maior parte do canto e fala. Prefiro outras denominações, as usarei por serem bastante difundidas, e já explico o por que. Pesquisas recentes já desconsideram os subregistros, e pedem a troca da palavra registro para mecanismo laríngeo, pois registro está muito ligado ao tipo de som percebido, e mecanismo laríngeo é mais fácil de ser compreendido como ajustes musculares. 

As pregas vocais (músculo revestido por mucosa) são responsáveis pela nota entoada e pelo tipo de registro emitido. Quando elas estão vibrando por todo o comprimento e profundidade do músculo vocal (TA), você está com som dominantemente de “peito” (esqueça ressonância aqui, apesar desse termo ser utilizado por muitos como voz que ressoa no peito), se você contrai os músculos CT, inclinando a cartilagem cricóidea para trás e para baixo principalmente, e também a cartilagem tireóidea para frente e para baixo (movimento de báscula), você está alongando e afinando as pregas vocais e as colocando para vibrar apenas em suas extremidades superiores, o que da ao som uma qualidade mais leve, muitas vezes chamado de registro "cabeça", ou se a ação de TA for mais fraca, iremos para o registro elevado, ou falsete.
Ou seja, acionando mais o músculo vocal, ou TA, a prega vocal tem uma área de vibração mais grossa, com mais massa, acionando menos esse músculo, o CT vai sobressair e a massa e a espessura da área de vibração da prega vocal serão menores.

Aqui é importante deixar claro que não existe voz isolada de TA, o CT está sempre ativo, e nos graves o TA entra em ação em conjunto, encurtando as pregas vocais, como visto em trabalhos de Hirano da década de 80.

Muitas pessoas atribuem o nome dos registros ao local onde o som vibra, mas ressonância tem a ver com o resultado de como você manipula o som feito, e não onde ele é gerado. Na história da voz e do canto (partes 1 2 3 4 e conclusão, recomendo a leitura) entendemos por que essa confusão, mas hoje em dia não podemos aceitar mais tal associação, afinal de contas, a voz não sai pelo meio da testa, não sai por entre os olhos, não sai do peito como o raio dos Ursinhos Carinhosos ou coisa do tipo, ela sai sempre pela boca e/ou nariz. Perdi a conta dos alunos que estudavam canto dessa forma mas se sentiam frustrados por não entender ou ter a sensação de voz que vibra no peito, no topo da cabeça, na testa, na nuca, etc.
Repare que o músculo CT se contrai, aproximando as cartilagens e esticando o ligamento vocal.
O som surge nas pregas vocais, ele começa a vibrar na laringe independente de onde você sinta ressoar, na cabeça, no peito, no pescoço, no joelho, etc..

É a interação entre os músculos da laringe que vai determinar se o som é suave, bruto, intenso, soproso, etc.. O resto das mudanças de timbre vão aparecer com o uso dos ressonadores e articuladores no trato vocal, que já comentamos aqui no blog.

Na próxima parte vamos ver como funcionam e o que faz cada um desses registros vocais.