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sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

A voz não é invisível


Workshop de tecnologias aplicadas ao canto, que ensina cantores, fonoaudiólogos e professores a utilizarem programas de análise acústica e outras ferramentas de feedback visual em tempo real para que aulas, treinos e clínica tenham resposta mais prática e eficiente.

O curso Ver a Voz nasceu em 2018 do interesse dos professores de canto, que necessitam de ferramentas objetivas para demonstrarem aos alunos seu desenvolvimento de maneira concreta. Ele foi pensado a partir da prática e experiência do professor e pesquisador Mauro Fiuza sobre o tema e de como essas tecnologias são aproveitadas por preparadores vocais de ponta no mundo todo.

Com a divulgação do curso, surgiu o interesse de fonoaudiólogos, otorrinolaringologistas e pesquisadores de voz cantada em participar. Sendo assim, o Ver a Voz foi direcionado também para esses profissionais, com informação útil na habilitação ou pesquisa de canto. Foram diversas edições presenciais do curso em São Paulo, Niterói, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e que acabaram sendo ministradas também em universidades, palestras e congressos presenciais ou online e todo o Brasil.

Para a nova edição online do Ver a Voz (outubro de 2021), Mauro convidou uma das professoras e pesquisadoras mais respeitadas atualmente no mundo, que conta com um currículo invejável e diversas publicações e apresentações sobre o treino de canto com o uso de tecnologia, para ministrar o curso em conjunto e acrescentar ainda mais qualidade ao conteúdo, a Dra. Filipa Lã, de Portugal.

As inscrições podem ser feitas por pagamento com cartão de crédito ou PIX nos links: 


Clique para mais informações
Hoje em dia são raros os cantores que têm um acompanhamento diário de seus treinos, e ter um feedback visual possibilita que sejam mais objetivos e claros, com resultados visiveis na tela em tempo real, facilitando a vida tanto de cantores que estudam sozinhos quanto os que fazem aulas poucas vezes por semana ou por mês.

As práticas descritas no curso são aplicáveis a todos os tipos de canto, gêneros e técnicas musicais. 

Assuntos como: afinação, controle de passagem e de registros, controle de ressonância, pressão subglótica (apoio), precisão de ataques vocais, fraseado, legato e sustentação de sons, vibrato, articulação de vogais e até mesmo distorções vocais são facilmente trabalhadas com precisão com essas ferramentas.
Outras possibilidades de uso são comparações entre vozes, comparação pré e pós intervenção, análise de fonte glótica e filtro/ressonância e muito mais. 

São inúmeras as possibilidades de uso dessas tecnologias e saber interpretá-las é essencial. 

Durante o Ver a Voz serão explicados de forma prática e acessível conceitos importantes de acústica vocal como harmônicos e formantes, base teórica para a utilização dos softwares, e como utilizá-los na prática voltada ao estudo e ensino de canto. 

Programas gratuitos (MADDE, Wavesurfer, Sopran, RTSect, RecVox) e pagos (Voce Vista 3 e Voce Vista Video) são demonstrados em situações reais de aula e treino de canto aplicadas para auxiliar a fácil compreensão de todos os presentes.

Todos os participantes recebem um desconto exclusivo (50%) no programa Voce Vista Video, oferecido por seus desenvolvedores na Alemanha.

Confira fotos de edições anteriores do Ver a Voz.

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Formantes, ressonâncias, sintonização de vogais. Como utilizar? Parte 4

Atenção, esta é a última parte de um texto que começou AQUI. Ler tudo é essencial para a compreensão do que segue.

Algumas estéticas de canto podem querer maior destaque no terceiro harmônico após a região de passagem TA – CT, como é falado por outro cientista vocal, Dr. Hubert Noé, nesse caso, uma laringe mais estabilizada é o desejado, e as vogais soarão menos estridentes. Isso é conseguido deslocando F2 para H3 (em vogais fechadas, como /i/ e /u/, F2 sintoniza com H4). Nesse estilo de mix, as vogais são aproximadas, distanciando-se das extremidades e aproximando-se de vogais mais neutras, como o nosso querido "schwa", a vogal com som oral de â. Pense em cantar todas as vogais sem se destanciar muito desse som, a boca aqui não será aberta com um sorriso, e nem terá uma abertura tão exagerada como no belting.

Mas formantes não atuam sozinhos, e nem se conectam apenas com harmônicos, eles podem atuar em conjunto, criando um agrupamento (ou cluster) dos formantes F3, F4 e F5 chamado de "formante do cantor". Um recurso utilizado por cantores líricos, que gera aumento enorme na intensidade dos harmônicos que estão próximos da região de 2500Hz fazendo com que suas vozes atravessem as orquestras e consigam ser ouvidas pelo público sem necessidade de amplificação.

Agrupamento de formantes não é só coisa de cantor de ópera, acontece também com atores e cantores de estilos mais próximos a fala (até mesmo no pop, rock, jazz, country, etc.), nesse caso o aumento de potência ocorre ao redor de 3500Hz com a aproximação de F4 e F5, e sua função é o aumento da inteligibilidade do texto, segundo o Dr. Dejonckere, e não do volume (estilos musicais de canto amplificado não precisam de aumento de volume/intensidade). 
Stivie Wonder, Bruce Dickinson, Idina Menzel
Luciano Pavarotti, Steven Tyler, Angela Gossow e suas bocas.
Esse controle dos formantes é o que possibilita que possamos praticar o canto harmônico, aquele em que 2 notas são emitidas ao mesmo tempo (falo mais sobre ele AQUI). O controle não é no nível da laringe, mas nos formantes, amplificando 2 deles e abafando os intermediários. O problema é quando você abafa os que não quer quando está praticando canto "normal", é nesses casos que a voz soa "pra dentro" e "sem cor".

O importante disso tudo é que o termo formante nada mais é que a forma como a ciência vocal chama as ressonâncias, e ressonância é resultado da movimentação dos articuladores. Sempre que um professor fala em palato, posição de laringe, língua, abertura de boca, espaço faríngeo, nasalidade, escolhe alguma vogal específica (ou sua forma) para determinado exercício, etc. ele está falando sobre realinhar formantes, de forma consciente ou inconsciente. Melhor se for consciente, pois ele vai ter mais facilidade em identificar que o que falta para determinado ajuste ser bem feito pode algo simples como abrir ou fechar a boca, colocar a língua mais pra frente, mais alta, mais baixa, etc., além do trabalho na laringe.

Falei aqui sobre diversos aspectos acústicos da voz, e de sua relação com a anatomia e fisiologia do trato vocal, e até mesmo da musculatura extrínseca da laringe (pescoço, ombros, cabeça, e tudo que se conecta à laringe de fora), que pode modificá-lo. Alguns autores relacionam os formantes também à movimentação da musculatura intrínseca da laringe (aquela que está dentro da laringe, como TA, CT, CAL, CAP, AA, etc.), o que é óbvio, pois cada movimento desses músculos alteram também o formato do trato vocal, que altera a vibração das pregas vocais (como descrito por Sundberg, com réplica do texto na primeira parte deste artigo), que altera a pressão sub-glótica e todo o ciclo, nos mostrando, mais uma vez, que a voz é o conjunto de um todo, não apenas parte A ou B. A laringe parece comandar todo o mecanismo, mas as demais partes a influenciam e podem acabar com seu desempenho ou aprimorá-lo.

Seria possível afirmar também que a importância dos formantes aumenta em estilos de canto não amplificados, como o lírico, pelo fator impulsionador da intensidade, porém não devemos negligenciar seu papel na construção de timbres e estéticas vocais. A única verdade final e absoluta na ciência, é que ela vai mudar um dia, devemos estar atualizados e abertos a tudo que possa nos ajudar

Bons estudos, e espero que estejam cheios de dúvidas, assim como eu!!

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Formantes, ressonâncias, sintonização de vogais. Como utilizar? Parte 3

Esta é a terceira parte de um texto que começou AQUI

Uma pergunta que me foi feita:

“Formante é uma ferramenta pra medir o canto lírico?”

Não. Formante é um pico de energia em uma região do espectro sonoro, ele define vogais, define timbre e tudo mais relacionado a som, seja no canto (qualquer um), na fala, nos instrumentos musicais e em áreas fora do mundo musical. Em 1938 James Jeans já falava em formantes.
Espectrograma das vogais, na mesma intensidade, com mesmo ajuste muscular na laringe. Cada linha é um harmônico da voz. Quanto mais brilhante, mais reforçado está o harmônico, e isso é resultado dos picos de energia dos formantes.
Alguns pesquisadores da acústica vocal descobriram que a voz tem maior eficiência quando formantes e harmônicos estão sintonizados. Isso amplifica o som ou enfatiza determinada característica do timbre da voz e aprimora a interação entre ressonância e fonte sonora (pregas vocais), reduzindo o esforço.

Sintonizar formante, ou sintonizar vogal, é fazer com que o pico do formante esteja ressoando na mesma frequência de um dos harmônicos escolhidos, e dependendo de qual, um som diferente vai acontecer. Simplificando, você pode pensar que a vogal (formante) ajuda a amplificar determinada nota (harmônicos) ou característica de timbre. 
Voce Vista com a vogal /a/. Na metade de baixo, os picos de
formantes isolados, na de cima, as linhas dos harmônicos
sendo moldadas pelos picos
Um programa de análise acústica mostra isso de forma bem simples  como no print screen que vocês podem ver do programa Voce Vista, mostrando os harmônicos acima e os formantes abaixo, perceba que na imagem de cima os harmônicos formam montes mais altos quando há um pico de formante.

É importante perceber que não existem frequências exatas de formantes para cada vogal, mas regiões, como podemos ver nas tabelas abaixo. O que nos mostra que diferentes posições de trato podem ser percebidas como um mesmo som, e mais, nos mostra que mesmo pessoas com anatomias distintas conseguem, por ação dos articuladores, modificar como soa, alterando a “cor natural” da voz, utilizando a “cor desejada”.
regiões dos formantes F1 e F2 das vogais na fala e também dos instrumentos musicais
F1, F2 e F3 em varias vogais, que você pode comparar com a figura do Voce Vista que gravei acima.
Exemplos de sintonização de vogais abordados por estudos como os de Schutte e Miller (1993) e de LeBorgne (2001) são os cantores de elite de belting, que mostram que F1 (prImeiro formante) fica na altura de H2 (segundo harmônico) , e eles fazem isso elevando a laringe. O resultado é um som poderoso sem a necessidade de aumentar a adução das pregas vocais, fazendo o belting com “registro misto” (músculos trabalhando em conjunto, porém com predominância de TA sobre CT) e não “de peito” (TA sendo forçado), como alguns imaginam.

Abrir mais a mandíbula em vogais abertas como /a/ ajuda nesse caso, principalmente em notas hiperagudas, tanto no canto lírico como em estilos populares. Em vogais fechadas, como /u/ e /o/ abrir os lábios resolve e nas vogais /i/ e /e/ deve-se ampliar os espaços na cavidade oral, aplainando a língua. Dessa forma, F1 continuará acima da nota fundamental, mesmo em vogais que possuem primeiros formantes mais graves.

Aqui vale uma observação importante feita pelo Dr. Sundberg: Muitos professores de canto alarmam que laringe elevada equivale a risco vocal, porém, estudos nos mais diversos estilos musicais, até mesmo em sopranos de ópera encontram esse ajuste sendo utilizado, e mesmo assim suas carreiras são longas e bem sucedidas.

Não entenda isso como “cante sempre com a laringe alta, o Mauro falou que é melhor”. Não, laringe alta tensa é prejudicial, causa hiperfunção e pode gerar microtraumas na musculatura, que cobrarão seu preço ao longo do tempo. Porém, em determinados casos, como quando se quer um som de timbre mais agudizado, é uma opção a ser considerada. (não confundir laringe alta, socada na base da língua, com laringe elevada).

Novamente, vale aquela observação de que cantar requer trabalho muscular direcionado, o que é diferente de tensão generalizada, saber diferenciar os dois é o que vai resolver a vida de qualquer cantor.

A última parte deste artigo você pode ler clicando AQUI.

terça-feira, 28 de julho de 2015

Formantes, ressonâncias, sintonização de vogais. Como utilizar? Parte 2

Esta é a segunda parte de um tecto que começou AQUI

Nosso trato vocal é capaz de criar vários formantes (que nada mais são do que ressonâncias), que são mostrados como picos dos parciais, mas normalmente estamos mais interessados nos 5 primeiros. Os dois primeiros, junto com o terceiro nos fazem identificar as vogais, os 3 últimos são responsáveis por alterar a “cor” (junto com a fonte glótica, não esqueça que os ajustes musculares na laringe afetam diretamente o som percebido também). 

Nós modificamos esses formantes alterando o comprimento do trato vocal e sua área (a posição dos articuladores), e a cada modificação teremos um timbre mais “claro” ou mais “escuro”, ou pensando em ciência, com maior ou menor reforço nos harmônicos agudos, respectivamente.
É importante atentar ao fato de que cada movimento no aparelho fonador altera a posição dos formantes (um dos primeiros ressonadores é o ventrículo laríngeo, uma cavidade formada entre as pregas vocais e as pregas vestibulares), o que implica trabalhar com eles você querendo ou não, sabendo que eles existem ou não, é apenas mais um dos inúmeros fenômenos que ocorrem na voz. E se eles estão lá, por que não conhecê-los? É mais uma ótima ferramenta que cantores e professores podem estar atentos, e estão, quando escolhem vogal, modificam posição de articulador, altura de laringe, etc..
 
Representação do tubo do trato vocal
e seus alargamentos e etreitamentos
que moldam os formantes e o som.
O comprimento do trato vocal é medido da glote (na altura das pregas vocais) até a saída dos lábios e/ou nariz e varia entre pessoas de diferentes tamanhos, sejam homens e mulheres adultos ou crianças, porém, nossa flexibilidade pode alongar ou encurtar esse comprimento, subindo ou descendo laringe, projetando os lábios para frente ou os abrindo em um sorriso.
Em termos práticos, quanto mais longo o trato vocal, mais grave os formantes (o chamado som “escuro”), e o contrário se aplica, encurtando o trato teremos formantes mais agudos (chamado som “claro” ou até “estridente”).

Já a alteração provocada pelas diferentes posições dos articuladores, e consequentes áreas no trato vocal tem uma variação mais complexa. O movimento de um único articulador, tende a alterar todo o conjunto de formantes, mas alguns deles são mais afetados que outros.

·         O primeiro formante F1 (garganta e faringe) se agudiza com maior abertura de mandíbula ou com constrição da faringe, ficando mais grave em aberturas menores.
·         F2 (boca) é predominantemente dominado pelo corpo da língua: Quando pressionamos a língua no palato duro (atrás dos dentes superiores) o segundo formante se eleva. Quando a língua pressiona na altura do palato mole (mais para trás da boca) F2 abaixa, especialmente se os lábios forem arredondados junto.
·         F3 sofre bastante alteração com a ponta da língua e o espaço que gera entre os dentes incisivos inferiores, diminuindo quando esse espaço aumenta, ou seja, deixar a ponta da língua encostada nos dentes de baixo eleva esse formante.
·         Os quarto, quinto e demais superiores são definidos mais pelo comprimento do trato vocal, porém o F4 ainda sofre bastante influência do formado do tubo da laringe, se mais amplo ou mais estreito.

Formantes em geral são reduzidos com alongamento (laringe baixa, lábios projetados para a frente) do tubo do trato vocal e aumentam com seu encurtamento (lábios estirados, como em um sorriso e laringe elevada).
Boca mais fechada reduz F1 e eleva F2, como na vogal /i/.
Constrição na faringe Eleva F1 e reduz F2, como na vogal /a/. 

Os picos dos 3 primeiros formantes
É graças a essas mudanças acústicas que um cantor consegue ser ouvido quando está a capella, e isso vale para a maioria dos cantos não amplificados, sejam eruditos ou populares, como os folclóricos ao redor do planeta. Graças a isso também uma voz pode soar “pra dentro”, “nasal”, “brilhante”, “abafada”, etc., e, como mencionado na parte 1, até mesmo interferir na vibração das pregas vocais, alterando os ajustes musculares.

Ainda não acaou, na próxima parte falarei sobre a sintonização de vogais para uma maior eficiência na voz.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Formantes, ressonâncias, sintonização de vogais. Como utilizar? Parte 1

Antes de começar a seguir o texto abaixo, assegure-se de ter lido ESTE AQUI SOBRE ARTICULADORES E ESTE AQUI SOBRE ACÚSTICA. Pois o tema de hoje é bastante complexo e um conhecimento prévio vai facilitar as coisas. Existem livros inteiros sobre o tema e tentarei expor pra vocês aqui no blog. Qualquer dúvida, manda aí embaixo.

Recapitulando brevemente: Nosso trato vocal é repleto de estruturas maleáveis, que se movimentam constantemente alterando seu formato, criando ou estreitando espaços através dos articuladores (língua, lábios, mandíbula, véu palatino, faringe e laringe). Cada espaço, ou cada formato, amplifica ou abafa diferentes as frequências geradas pelas pregas vocais de maneira particular, e as que são amplificadas com maior eficiência são chamadas de formantes pela ciência vocal e ressonância pelo canto.
Ou seja, cada posição de boca, faringe, altura de laringe, etc. ressoa com maior intensidade algumas das ondas sonoras produzidas pelas pregas vocais quando estão com uma forma e menos outras ondas, e esse cenário se modifica a cada novo formato do trato vocal.

Lembra da série harmônica? Emitimos uma nota e ela vem acompanhada de muitas outras frequências múltiplas mais altas. Nossos formantes vão pegar essas frequências e amplificá-las, modificando violentamente a característica do som que estamos emitindo e até afetando o modo de vibração das pregas vocais abaixo. 
Helena Daffern and Jude Brereton
O som é uma série de variações na pressão de ar, como pulsos de grande pressão alternando pulsos de baixa pressão. Quando cantamos uma nota, o pulso de ar passa pelas pregas vocais e chega ao trato vocal, podendo ser direcionado para fora, ou jogado de volta para dentro, de acordo com cada formato escolhido. Segundo o prof. Dr. Johan Sundberg, uma pressão que retorne no momento indevido da vibração das pregas vocais, pode paralisar sua vibração. Percebe-se aí a importância de trabalhar bem essa parte para ter a voz soando como desejado.
Foto do livro Ciência da Voz, de Johan Sundberg, tradução por Gláucia Lais Salomão
Recapitulando a acústica vocal: Emitimos uma nota fundamental, a nota que queremos cantar, além dela, inúmeros sobretons, chamados de parciais, e a alguns deles são harmônicos. Harmônicos são frequências múltiplas da nota fundamental, por exemplo, cantando uma nota Lá 2, que equivale normalmente a 220Hz (200 ciclos de vibração das pregas vocais por segundo), seus harmônicos estarão a 440Hz, 660Hz, 880Hz, e por aí vai.
A imagem do som
Na próxima pare deste texto, como cada formante é criado no corpo, e como moldá-los. CLIQUE AQUI PARA VER

terça-feira, 28 de abril de 2015

O AFI e a ressonância

Você conhece o AFI, ou IPA?

O Alfabeto Fonético Internacional (AFI), ou em inglês, International Phonetic Alphabet (IPA), é um alfabeto que demonstra como pronunciar qualquer vogal ou consoante de qualquer idioma do planeta. São aqueles símbolos estranhos que vemos em dicionários bilíngues.

Ex: above (əˈbəv).
Se você conhece os símbolos do IPA, é capaz de dizer a palavra acima com perfeição, e por isso é algo tão útil quando você vai treinar idiomas.
O símbolo ə representa a vogal neutra que chamamos de “schwa”

Mas o que isso tem a ver com canto, já que esse é um site sobre isso? Seria esse um texto sobre como cantar em outras línguas?

Não, apesar de servir pra isso também.

A questão aqui é mais importante ainda graças ao nosso mecanismo não linear de canto.
Muitas pessoas imaginam a voz com o ar saindo dos pulmões, passando pela laringe e saindo pelo trato vocal, mas não é só isso. Existe um complexo sistema de interação. O ar sai dos pulmões com certa pressão, a laringe vibra, gerando o som, o trato vocal filtra os harmônicos que a gente quer e, dependendo da forma que criamos, ele devolve mais ou menos pressão para dentro (pressão retroflexa), afetando o funcionamento da laringe e a maneira como estamos emitindo o ar, e tudo isso acontece ao mesmo tempo, sendo regulado pelo nosso cérebro através da percepção auditiva e da propriocepção.

Se você não leu o texto sobre o trato vocal, harmônicos e formante, pare agora e confira nos links abaixo, vai facilitar a compreensão deste artigo.


Esse sistema não linear implica que a posição da minha língua, lábios, abertura de boca, etc., vai influenciar no meu registro vocal (a pressão volta e afeta a laringe, onde são determinados os ajustes de voz de peito, voz de cabeça, falsete, etc.) facilitando ou dificultando o som, ou seja, ajudando ou prejudicando você a cantar. Sim, escolher a vogal certa pode resolver aquele probleminha que você está tendo com determinada nota.

Aí entra o AFI/IPA. Bons professores de canto sabem como utilizar cada vogal para cada objetivo, até mesmo em diferentes alturas de notas a vogal escolhida favorece um tipo de ajuste ou outro, um registro ou outro. É a ação dos formantes, a nossa boa e velha ressonância.

Portanto, pense na ressonância como esses movimentos e espaços criados no trato vocal, será muito mais fácil de entender do que “voz que vibra aqui” ou “vibra ali”. Veja como essa sensação de vibração nada mais é do que a região onde tem maior estreitamento, como entre a língua e o céu da boca ("vibra pra frente ou pra cima") ou da língua com a faringe ("vibra pra cima, ou pra trás").
Posição da língua nas vogais abertas
Posição da língua nas vogais fechadas


À esquerda da linha, as vogais de boca alargada
à direita, as de boca mais arredondada

No AFI, você vai encontrar a posição de abertura de boca e língua mais adequados (daí a importância, muitas vezes negligenciada, de treinar a capacidade de movimentação independente de cada um dos articuladores da voz) para o som que deseja, através do que alguns chamam de “sintonização de vogais”.

Comece a ouvir seus cantores favoritos e perceber como eles alteram (consciente ou inconscientemente) as vogais durante algumas palavras, e perceba que isso não afeta a inteligibilidade do contexto.

Além das vogais, que são os condutores do canto, o AFI mostra as posições onde são geradas as consoantes, e isso pode nos ajudar a articular as palavras de um jeito que elas não influenciem negativamente, e em muitos casos, o mau uso das consoantes pode acabar com o resultado sonoro e nem perceberemos que elas são as culpadas.

Algumas consoantes, como as fricativas e nasais também são ótimas para nos ajudar em situações como trabalhar passagens, saltos e quantidade de tensão muscular das pregas vocais. Percebe a importância?
Em cada célula existem duas colunas. Na esquerda, estão as consoantes surdas
na direita as sonoras, ou seja, com vibração de pregas vocais

Em regras gerais, vogais mais fechadas, como /i/ e /u/ facilitam aliviar o registro, e vogais abertas como /a/ e /ɛ/ facilitam registros mais pesados.

Nesse link você encontra a lista completa do alfabeto fonético e poderá ouvir cada um dos sinais
http://www.internationalphoneticalphabet.org/ipa-sounds/ipa-chart-with-sounds/

Não esqueça de desenvolver a independência e flexibilidade dos articuladores, eles não vão definir "apenas" sua diccão, mas participam de todo o conjunto para gerar o som que você quer. Talvez seja isso que está faltando.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

É possível cantar 2 notas ao mesmo tempo.


Recentemente, um vídeo de uma cantora fazendo uma manobra vocal “sobre-humana” invadiu as redes sociais. Trata-se de Anna-Maria Hefele mostrando uma habilidade e controle incríveis dos harmônicos da voz para emitir 2 notas ao mesmo.
Também ao mesmo tempo, surgiram reportagens dizendo que emitir 2 notas simultâneas seria algo “extremamente raro”, um “talento para poucos”, e aquela besteira sensacionalista que estamos acostumados, e que combato sempre aqui no blog.

Alguns acham que ela utiliza 2 fontes sonoras, outros que ela faz algo quase que digno dos x-men, mas, afinal de contas, como é possível alguém emitir 2 notas? Será que a cantora do vídeo é um fenômeno raro? De onde surgiu essa prática?

Quem leu meus textos sobre acústica e trato vocal (consulte no índice ao lado) já sacou que não há nada de extra-terrestre na Anna-Maria, exceto pelo seu domínio incrível de manipular diferentemente esses sons, que chamamos de sobretons.

Retomando e resumindo o tema: Quando o ar passa pelas pregas vocais, a vibração da mucosa dessas pregas gera uma nota fundamental, que é aquela que queremos cantar, e somado, gera uma série de outras notas. No nosso trato vocal, essas frequências emitidas serão abafadas ou amplificadas e quando ouvidas em conjunto formarão o timbre, o tipo de som, aquilo que diferencia a sua voz da do seu vizinho, de uma chaleira, de um colibri, de um violino, e tudo mais no planeta. Ou seja, quando cantamos uma nota, cantamos uma infinidade delas, os harmônicos, e inconscientemente selecionamos alguns para criar sons culturalmente compreensíveis.

Aí entra a técnica do overtone. Com alguns movimentos do trato vocal (língua, lábios, palato, etc.) somos capazes de abafar mais ainda alguns harmônicos e amplificar incrivelmente outros (através dos formantes), fazendo com que eles se destaquem e apareçam como uma nova nota somada à primeira, a fundamental. O canto de overtones, ou canto harmônico, ou difônico, nada mais é que cantar uma nota e posicionar o trato vocal para que ele mostre outra nota junto.

Apresento Miroslav Grosser, um alemão que tem uma série de vídeo aulas sobre o tema, é muito fácil reproduzir overtones, até não contores conseguem fazer facilemente. Mas calma, ter o controle da Anna-Maria já é algo bem mais complexo e exige um trainamento muito mais refinado. 

Siga os passos do Miroslav no video a seguir e divirta-se. O mais fácil que ele fala é transitar lentamente entre as vogais I e U, tentando ouvir os harmônicos saltando.

Essa prática não surgiu agora, ela é milenar, e encontrada em países como Mongólia, Tuva (uma região da Sibéria), Tibet, Cazaquistão, Turcomenistão. Atualmente é muito fácil encontrar artistas desses países no youtube, e vou deixar aqui uma seleção bastante interessante.

Em algumas das técnicas (são várias) existem também a vibração das pregas vestibulares (lembra dos drives?) e o som sai ainda mais esquisito, para nós ocidentais.

Miroslav Grosser destruindo:
O grupo Huun Huur Tu:
De Tuva:
Rock mongol com overtone:
Techno com overtone:


Lembre-se, voz é moldável, se você quer fazer, basta treinar da forma correta.

Pra quem se interessar, aqui está um artigo completo sobre a técnica dos cantores de Tuva, é fantástico:
https://math.dartmouth.edu/archive/m5f10/public_html/Levin1999SciAm_tuvan_throat_singing.pdf

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Por que não gosto da minha voz gravada?

Essa é uma questão bastante comum, e uma dúvida que faz todo o sentido.
Quando ouvimos nossa voz gravada pela primeira vez achamos muito esquisita simplesmente porque não é a voz que estamos acostumados a ouvir, e existem algumas explicações para isso.

Em primeiro lugar, quando falamos ou cantamos nosso ouvido capta o som de duas formas, pelo ar, o som que se propaga, e por condução óssea, o som que faz nosso corpo vibrar internamente. As outras pessoas e as gravações não captam nossa condução de som interna, apenas a que se propaga pelas partículas do ar.

Outra razão importante. Quando gravamos um som dependemos da qualidade de captação do microfone que estamos usando. Lembra dos textos sobre acústica, harmônicos, e etc?. No manual de todos os microfones existe um gráfico com sua “curva de captação de frequência”, que mostra quais frequências ele capta mais e quais capta menos. Se nossa voz é formada de uma série de harmônicos e o microfone não capta todos, ou não os grava da mesma forma, o que sairá na gravação é um som diferente não apenas do que ouvimos, mas também do que as outras pessoas ouvem.
Além disso, a maioria deles proporciona o que chamamos de "efeito de apromoximação", que amplifica mais os harmônicos graves da voz a medida que você canta mais perto da capsula, ou seja, quanto mais perto do mic, mais "cheia" sua voz vai soar, e isso é utilizado pra alterar o timbre da voz nas frases e notas cantadas.

Curva de resposta de frequência de um microfone, amplifica umas mais que outras. 
Complicado não é? Entendem agora a importância de um bom microfone, que se adapte perfeitamente à sua voz e ao tipo de som que você canta e emite? Já ouviu sua voz gravada no telefone ou no microfone do computador? Dá um aperto no peito, hehe.

Outro agravante aí é a caixa de som. Imagine que você se acostumou a sua voz gravada, utiliza um ótimo microfone, aí você pega essa gravação e ouve na casa de um amigo. Talvez você estranhe novamente a voz.

- Como assim? –

Cada caixa de som, amplificador, etc. reproduz o som gravado de uma maneira diferente. Atualmente muitas caixas, fones, etc. têm “corretores” de graves, que servem para deixar o som mais pulsante e a batida mais marcante (pense naquele carro que passou tocando um “batidão”). Daí a importância de uma gravação, mixagem e masterização bem feitas, utilizando monitores de áudio sem intervenções para “melhorar” o som e com um produtor/técnico de som com experiência, capaz de gravar sua voz de um jeito que saia bem, independente de qual dispositivo você utilizar pra ouvir.

Grave-se cantando sempre que possível e ouça bastante, você precisa se acostumar a esse “outro eu”, pois é ele quem vai aparecer em público. Procure ter seu próprio microfone, além da questão higiênica (evita babas alheias), ele te dará sempre o mesmo som. Se tiver banda, procure ter um técnico de som nela, ele poderá salvar sua vida, e, se não for possível, faça uma boa passagem de som para deixar sua voz sair como está acostumado nas apresentações.

Importante: um retorno de áudio vai bem também. Se você não se ouve direito no palco a chance de não cantar bem é enorme. Seu cérebro precisa dessa resposta auditiva para saber o que está fazendo, e é ela quem "regula" a voz. Cantar sem se ouvir prejudica violentamente o desempenho até de cantores profissionais do mais alto nível, e não é frescura ou desculpa furada, é como atirar flechas de olhos fechados...

Conto nos dedos de uma mão os locais onde já cantei e tive um retorno de som bom, e essa é a realidade no nosso país, infelizmente. Faça um esforço para ter seu próprio retorno, de preferência um monitor in ear (aqueles de fone).

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Acústica no canto, o poder do trato vocal. Parte 2

Leia a primeira parte deste texto clicando AQUI

Emitimos um som cheio de harmônicos, e por isso minha voz é diferente da do meu vizinho e do meu cachorro e do meu liquidificador. Mas, e daí?


A cavidade oral, com os lábios, dentes, 
palato duro, palato mole e língua
E daí que nós temos algo chamado trato vocal. Aquele “módulo” que fica entre a as pregas vocais e os lábios. Um “tubo” formado pela faringe, boca, etc., e que movimentamos o tempo todo para falar e cantar. É no trato vocal que esses harmônicos são “filtrados”, aumentando o volume de uns, abafando o de outros, causando uma série de resultados acústicos diferentes.

Sustente uma vogal qualquer na mesma nota e mude a posição de cada um dos seus articuladores, e perceba como cada pequeno movimento altera a característica da vogal emitida.

Graças a essas mudanças nos harmônicos, cada posição no trato vocal modifica o tipo de som gerado, altera as vogais, as consoantes e varia também o timbre. Lembra dos textos sobre articulação?  Se não, veja as partes 1, 2 e 3.

É nessa hora no texto que entram os formantes.

Representação dos formantes em uma
análise acústica
Formantes são as ressonâncias. "Hein?"

Com a misteriosa capacidade (sim, estou sendo irônico) que nós temos de moldar o trato vocal através de abertura de boca, posição da língua, altura do palato mole, aproximação ou distanciamento da base da língua e da faringe, etc, criamos diferentes formas que privilegiam alguns harmônicos e abafam outros, essas "frequências preferidas" recebem o nome de formantes na ciência acústica. É aqui que a coisa começa a ficar interessante.

Os formantes 1 e 2 (F1 e F2) são importantíssimos para definir qual vogal estamos emitindo, seja na fala ou no canto. Quando modificamos o trato vocal nós mudamos os formantes, como resultado sonoro aparecem as vogais diferentes. Interessante, não? Os demais formantes vão determinar mais a qualidade de cada som (aqueles termos como: "brilhante", "aberto", "fechado", "claro", "escuro", "pra dentro", "na máscara", etc.)

Perceba que isso não acontece no canto somente, e nem depende de estilo musical, é um fenômeno que simplesmente acontece e foi descrito, tal qual a lei da gravidade. Importante não fazer confusões aqui.

Um ponto interessante diz respeito à clareza dos sons das vogais. Cada vogal é formada em determinados formantes, uns mais graves, outros mais agudos. Se você vai cantar uma nota muito aguda, possivelmente o formante necessário para a formação de uma ou outra vogal tenha ficado para trás (seja mais grave), e, por isso, o som que você tenta fazer nem sempre é inteligível, ou 100% preciso. Tente entender a letra de trechos muito agudos nas músicas, fica bastante complicado.

Um dos outros poderes dos formantes, que por muitas vezes é tratado de maneira quase mística (mas que é bem científico), é o tal do “formante do cantor”. 
Comecei o assunto no primeiro texto falando do solista de ópera que tem que "atravessar" a orquestra, e é assim que ele consegue isso. O “formante do cantor” é um agrupamento dos formantes 3, 4 e 5 (F3, F4 e F5), que gera um pico extraordinário em uma região que o ouvido humano é mais sensível (em torno de 2500 Hz a 3500 Hz, segundo o Dr. Phillippe Dejonckere). Esse pico pode elevar o volume do que é cantado em até 30 dB em casos extremos (Dr. Hubert Noe), e isso, é muito “barulho”. Esse formante do cantor é normalmente feito abaixando a laringe e ampliando a abertura da faringe, mas existem outras estratégias, mas jamais, JAMAIS, fazendo força ou simplesmente "apoiando mais".
A linha pontilhada mostra o som produzido pelo cantor, repare o pico de amplitude que surge próximo aos 2500 Hz, se destacando da linha mais escura, que é a orchestra. Esse é o "formante do cantor". Leia abaixo.
E o "formante do cantor" é algo exclusivo da ópera? Não, esse reforço harmônico ocorre também em gêneros da música popular, mas a intenção aqui é dar mais “brilho na voz” (harmônicos agudos) e não aumentar sua intensidade, já que em música popular nós usamos o microfone par amplificar nossa voz.

Há ainda o “formante do ator” (ou do "falante", ou do "cantor não clássico"), que aumenta o volume, obviamente, dos atores no palco do teatro. E esse não envolve abaixamento laríngeo, o que deixaria o som mais "escuro", e no teatro a clareza do texto é ponto chave. Esse mesmo formante do ator é encontrado em estilos de canto que tentar ser mais próximos da fala, como no Teatro Musical e estilos derivados da música folk.

O formante do cantor é então a única forma de se fazer ouvir através de sons muitos fortes? Segundo Donnald Miller não. Seus exames acústicos em cantores como Luciano Pavarotti e Franco Corelli não encontraram tal ajuste. Coisa de ópera então? Não, Ethel Merman, a síntese do belting, usaria a mesma estratégia dos dois, segundo Miller.

Existe ainda algo chamado “canto harmônico”, ou overtone singing, ou throat singing, que é feito em locais como a Mongólia, Sibéria e Tibet. Nesse estilo, o cantor cria uma frequência fundamental e por manipulação do trato vocal consegue “pinçar” harmônicos isolados e amplifica-los fazendo soar duas notas ao mesmo tempo. Os ouvidos ocidentais, não acostumados, estranham de início e até duvidam, mas sim, um homem é capaz de cantar duas notas ao mesmo tempo. Como? É o poder da acústica e do trato vocal, veja o vídeo. E o mais legal é que é bem simples e qualquer um pode fazer.

Viu só? Você não precisa entender de acústica para falar ou cantar, mas na próxima aula que tiver duvido que pense “Ah, nunca vou usar isso na vida”. Agora, quando seu professor de canto disser que precisa abrir mais a boca, ou menos, posicionar a língua aqui ou ali, etc. você vai entender o que ele quer com isso, mesmo que ele não entenda.

Dê mais atenção para seu trato vocal, ele precisa de agilidade e precisa saber realizar trabalhos complexos. Não adianta querer, pensar ou imaginar apenas, ele precisa de condicionamento físico para entregar o som, e moldar as formas que você desejae que sua voz necessita.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Acústica no canto, o poder do trato vocal. Parte 1

Este é o primeiro de dois textos de um tema muito interessante, complexo e repleto de mal -entendidos. Espero que tenha conseguido deixa-lo o mais leve e didático possível sem comprometer as informações. Qualquer dúvida ao final dessa série podem postar nos comentários que terei o maior prazer em responder.

Já parou pra pensar como é possível um cantor lírico solista ser ouvido mesmo com uma orquestra e um coral soando ao mesmo tempo? E aqueles locutores ou cantores que tem a voz "aveludada", como conseguem ter um timbre tão bonito? E aqueles cantores de música infantil que fazem vários tipos de vozes diferentes? Vamos ser mais básicos ainda. O que acontece pra um som de Á virar som de Ê, ou qualquer outra vogal?

Essas perguntas descrevem uma série de resultados da acústica. Lembra aquela matéria que você teve no colegial, mas que nunca ninguém deu uma utilidade pra ela? Pois aqui a acústica faz toda a diferença. Você não precisa saber exatamente de tudo para cantar, mas se seu professor de canto souber, por melhor que ele já seja, o dará mais ferramentas e formas de abordagem para ajudar você a desenvolver sua voz. Explico.
Representação da onda sonora
Primeiro vamos relembrar as frequências e os ciclos de vibração. Cada ciclo de movimento de "abre e fecha" das pregas vocais faz com que o ar, que vem dos pulmões passe e pare, passe e pare, etc., emitindo pulsos. Esses ciclos, que duram milissegundos, vão produzindo os sons. Quanto mais rápido esse ciclo (ou quanto mais ciclos por segundo) mais aguda a nota emitida. Ok, podemos chamar essa nota de frequência, e essa frequência é medida em Hertz, quanto mais hertz, mais agudo, e para cada oitava que cantamos mais aguda o número de hertz (ou de ciclos de vibração. No nosso caso, vibração das pregas vocais) dobra. Um “Lá” depois do “Dó” central (aquele à direita da chave do piano, ou que na partitura fica entre a clave de “Fá” e de “Sol”) é produzido com 440 Hz, o “Lá” uma oitava acima com 880 Hz, uma oitava abaixo do primeiro teria então? Exato, 220 Hz, e por aí vai.

Oitava: Explicando vulgarmente, é a oitava nota de uma escala de notas que não repetem os nomes (chamada diatônica), por exemplo: Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si, tem 7 notas, a oitava seria o Dó seguinte. O nome se repete e a frequência dobra.
Essa frequência inicial, que queremos produzir é conhecida como frequência fundamental. Mas ela não sai sozinha.


Quem já estudou teoria musical provavelmente já ouviu falar em série harmônica. Quando emitimos uma frequência, seja na voz ou em uma guitarra, um piano, um trompete, um violino, etc., emitimos muito mais que a nota que desejamos. Junto dessa frequência fundamental, inúmeros outros harmônicos ressoam, múltiplos dessa que quisemos emitir, eles são notas que acompanham a fundamental. Ex: Cantamos uma frequência em 100Hz, os harmônicos soando junto estão em 200, 300, 400, 500 Hz, etc., formando o timbre final do som.

Vamos pensar em um piano. Digamos que você toque uma nota “Dó”, além desse “Dó” outras notas ressoaram juntas. Na série harmônica, que é responsável pelos nossos estudos de harmonia na música (acordes maiores, menores, acorde com sétima, acorde com decida terceira aumentada, etc.) os harmônicos da nota fundamental vão aparecendo como múltiplos inteiros, em oitavas, quintas, terças, etc. e formando o timbre da nota. Estudos mostram que para cada oitava acima de harmônico ressoando junto com a frequência fundamental o volume decresce em 12 dB até sumir, mas podemos manipular isso.

Ah, então os harmônicos são responsáveis por um violão soar como violão, uma voz como uma voz, um trombone como trombone, uma gaita de fole como a conhecemos, e assim por diante? Exato. O ataque também é importante, mas a discussão não é essa, hehe. Um som sem harmônicos seria aquele sonzinho chato de MIDI que tem nas trilhas sonoras de vídeo games dos anos 80. 

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